O período eleitoral afunila e a polarização entre Bolsonaro e PT parece inevitável. Ao que tudo indica, a velha coalizão de partidos alinhados ideologicamente à esquerda já começa a retumbar no horizonte. Partidos e partidários que já não vislumbram alçarem ao segundo turno iniciam seus movimentos. O PSDB de Alckmin, justamente aquele que nas duas últimas décadas rivalizou com o PT e dele recebeu pecha de representar a direita, sinaliza possível aliança com seu arquirrival. Despencando nas pesquisas, como uma jaca do cume da Jaqueira, o Tucano passa a usar seu tempo eleitoral buscando desconstruir o líder das pesquisas.
Álvaro Dias, do PODEMOS, depois de não conseguir colar sua imagem ao juiz Sergio Fernando Mouro, deixou cair sua máscara e abriu a boca como uma metralhadora desgovernada contra Bolsonaro. Já Amoedo, do NOVO, declarou neutralidade e disse que seu partido não apoiará ou orientará seus eleitores a votar neste ou naquele candidato. Ideologicamente de direita, de filosofia liberal, os Partidários de Amoedo não se vêem representados entre as duas possíveis opções; nas redes sociais, pregam o voto nulo ou branco no segundo turno. Alguns eleitores de outros candidatos, sem saber o que fazer, entoam o mesmo mantra.
Importante lembrar que o País vive um grande dilema: voltar à sistemática governista ditada pela esquerda lulo-petista e sua legião de partidos agregados, com seus dirigentes imbricados com a justiça, inclusive com inúmeros condenados e outros como réus ou indiciados; ou guinar levemente a direita bolsonariana e seu discurso conservador, com vistas ao resgate dos valores basilares da família e do civismo, não intervenção estatal na vida dos cidadãos, negação à teoria de gênero, dentre outros.
Ambos os lados possuem suas estratégias. A esquerda lulo-petista conta com discurso que encanta aqueles que se vêem como vítima do sistema e enxergam nas promessas a expectativa de dias melhores. Com forte apelo popular e populista, o lulo-petismo possui grande poder de mobilização das suas bases, assim como conta com a firme convicção dos seus correligionários, os quais dificilmente se deixam influenciar pelas notícias contrárias às suas crenças e às suas lideranças, ainda que regularmente condenadas judicialmente, à luz do devido processo legal. Para eles o que importa é o partido e a luta pela causa…
A direita bolsonariana empreende um discurso de reconstrução da nação e a não segregação dos brasileiros; prega e exalta as liberdades e o respeito às instituições republicanas e democráticas. Por outro lado, Bolsonaro não possui implicações com a justiça, diferentemente da maioria dos candidatos alinhados à esquerda. Contudo, dado ao seu forte discurso, sem meias palavras, contra aquilo que contraria a ordem, os bons costumes e agride a sociedade sofre todo tipo de represália midiática e é visto como o demônio a ser combatido a qualquer custo.
Embora demonizado por sua personalidade forte e apego ao conservadorismo, Bolsonaro conta com uma gama de eleitores composta por cidadãos que estão cansados do modus operandi lulo-petista e aspiram por mudanças. Tais eleitores anseiam por menos intervenção estatal no seio familiar, nas escolas e nos setores cruciais da vida; eles visam uma pauta mais liberal, desejam a moralização da administração pública federal, livrando-a da cooptação político-partidária, dentre outros.
O dilema está posto. Ele exigirá sacrifício daqueles que não se vêem representados por nenhuma das partes, o quais, querendo ou não, terão que avaliar a esquerda lulo-petista ou a direita bolsonariana e nelas enxergar os pontos que mais se aproximem dos seus valores ou princípios. Embora as opções não agradem, todos, sem exceção, serão governados por um ou por outro. A abstenção ou voto nulo ou branco será a tácita concordância com quem for eleito…
Os partidos de esquerda tendem a se juntar para combater a ameaça comum, no caso, a direita bolsonariana. Valerá a máxima: o inimigo do meu inimigo é meu amigo. Ainda que os votos brancos ou nulos não contem para nenhum candidato, os mesmos baixam os percentuais de votos necessários para eleger este ou aquele candidato, que certamente será aquele pertencente ao agrupamento de partido que melhor se organizar para manter seus votos e consiga arrebanhar os votos dos demais, alem de contar com os cidadãos que simplesmente lavarem as mãos e da poltrona assistirem o desfecho da história.
Caberá ao cidadão consciente, ideologicamente ou partidariamente, ligados ao PSDB, ao PODEMOS ou ao NOVO o dever e o poder de impedir que a esquerda lulo-petista se perpetue no poder. Sua abstenção permitirá que a maioria decida os rumos da sua vida. Aqui vale relembrar a advertência final de Joaquim Gonçalves Ledo ao príncipe D. Pedro, exortando-o a tomar uma decisão no momento crucial que antecedeu a independência brasileira:
[…] O Brasil, no meio das nações independentes, e que falam com exemplo de felicidade, não pode conservar-se colonialmente sujeito a uma nação remota e pequena, sem forças para defendê-lo e ainda para conquistá-lo. As nações do Universo têm os olhos sobre nós, brasileiros, e sobre ti, Príncipe! Cumpre aparecer entre elas como rebeldes ou como homens livres e dignos de o ser. Tu já conheces os bens e os males que te esperam e à tua posteridade. Queres ou não queres? Resolve, Senhor!
Nesse momento da história da democracia brasileira, ficar neutro é o mesmo que arrogar para si o título de Pôncio Pilatos. Ficar sobre o muro, na atual conjuntura, é ato de covardia e incompatível com a democracia, pois ela requer pessoas corajosas e aptas para tomar as rédeas do destino pelas próprias mãos. Como diria Martin Luther King: “O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons.”
Um verdadeiro cidadão consciente deve olhar para o passado, viver o presente e traçar os rumos do futuro, sem jamais esquecer que deve se distinguir por seu comportamento exemplar, baseado em princípios morais. Não se trata, contudo, da moral comum do homem mediano, mas sim daquela universal, de cujo postulado exsurgem os conceitos de liberdade e igualdade, conduzindo à construção de uma sociedade justa e fraterna, com condições igualitárias a todo ser humano.
A democracia não compadece dos covardes; ela exige pessoas com coragem e lucidez. Nela não há espaço para Pôncio Pilatos.
Informações Sobre o Autor:
Miqueas Liborio de Jesus
Auditor Fiscal do Município de Joinville (03/1998), Professor das cadeiras de Direito Tributário I e II, do Curso de Direito da Associação Catarinense de Ensino (ACE), Bacharel em Ciências Jurídicas (Direito), pela Universidade da Região de Joinville (Univille), aprovado no exame da OAB em 2006 e especialista em direito tributário pela FGV.
1 Comment
[…] em: https://www.miqueasliborio.com.br/na-democracia-nao-ha-lugar-para-poncio-pilatos/ – acessado em […]